domingo, 28 de julho de 2013

Modificando nosso cérebro, modificamos a nós mesmos





O neurocientista Richard Davidson acredita que a compreensão da neurobiologia das emoções pode ajudar a todos nós a desenvolver o "estilo emocional” mais adequado para melhorar nossas vidas.

Richard Davidson, começa o dia com uma meditação de 45 minutos, desde que ele visitou a Índia e Sri Lanka como estudante em meados dos anos 70. Essa prática acalma e lhe permite superar o estresse relacionado à profissão.
Em seu novo livro "A vida emocional do cérebro", Davidson explica porque a meditação e outras práticas semelhantes podem ajudar as pessoas a administrar melhor suas emoções, levando-as a uma vida mais produtiva e feliz.
Davidson, professor de psicologia na Universidade de Wisconsin-Madison, passou quase 40 anos estudando o funcionamento do cérebro a partir das emoções. Em seu livro, ele descreve, de forma empírica, seis "estilos emocionais."
De acordo com Davidson, a plasticidade do cérebro permite, através de práticas como a meditação e terapia cognitivo-comportamental, alterar o estilo emocional das pessoas.

O que mudou na compreensão das emoções pelos psicólogos no transcorrer desses anos de pesquisa?

Até meados da década de 1970, havia muito pouca pesquisa sobre as emoções. Os psicólogos cognitivos na época consideravam a emoção como algo que “interrompia” a cognição.
A ideia de que as emoções são adaptáveis, que elas podem desempenhar um papel importante na tomada de decisões e influenciando o comportamento, surgiu muito mais tarde.
A ideia de que o córtex está envolvido com as emoções era realmente uma heresia, porque o foco no campo das neurociências estava baseado exclusivamente no papel do tronco encefálico.
A emoção era considerada um processo psicológico primitivo.

O que levou a pensar que a emoção pode estar ligada ao córtex cerebral e não somente ao tronco encefálico?

Havia duas linhas de evidência. Uma relacionada a uma série de pesquisas realizadas em pacientes com danos cerebrais, que indicavam claramente que o dano cortical levava à interrupção das emoções.
A outra estava simplesmente ligada às minhas observações. Sendo um estudante do comportamento, estava muito claro para mim que quando nos comprometemos a tomar decisões complexas (por exemplo, "Eu quero esta pessoa como companheiro?", "Eu tenho que fazer esse curso de especialização?", "Eu devo realizar ou não esta compra importante? ") não estamos lidando com um frio cálculo cognitivo. As decisões complexas exigem o envolvimento de nossas emoções.

Em seu livro, você fala sobre "seis estilos emocionais." Quais são esses seis estilos, e como identificamos?

Os seis estilos emocionais surgiram ao longo de 30 anos de pesquisa neurocientífica.

O primeiro estilo é aquele que eu chamo de resiliência. Refere-se a rapidez (lentamente ou rapidamente) com que somos capazes de lidar com a adversidade. Algumas pessoas levam um longo tempo para se recuperar de situações difíceis, enquanto outras são capazes de se recuperar muito rapidamente.

O segundo estilo emocional é o “outlook” (perspectiva). Isso se refere à duração de uma emoção positiva. Está associado à propensão de ver o mundo de forma positiva ou não.

O terceiro estilo é a intuição social. Refere-se à capacidade de decodificar as emoções dos outros.

A quarta dimensão é o que eu chamo de auto-consciência, refere-se à precisão com que decodificamos os sinais internos do corpo associados com as emoções, como a frequência cardíaca, a sudorese e a tensão muscular.
Algumas pessoas são muito sensíveis ao que está acontecendo dentro de si mesmas, outras menos.

A quinta dimensão é o contexto. Quero dizer a sensibilidade ao contexto. Algumas pessoas modulam suas respostas emocionais de forma adequada ao contexto (por exemplo, eles falam com suas esposas de uma maneira diferente da maneira como falam com seu chefe). Outras pessoas fazem menos distinção entre contextos.

O sexto e último modelo emocional é a atenção (ou foco), que não é geralmente considerada como um componente emocional. Mas a atenção e as emoções estão muito ligadas.

No livro, eu descrevo os circuitos cerebrais subjacentes que suportam estes estilos e eu também destaco algumas experiências fundamentais que levaram à formulação de cada um deles.

Pode dar um exemplo?

Claro. A resiliência, por exemplo. - Todos nós, mais cedo ou mais tarde na vida, somos confrontados com a adversidade. E a resistência às situações adversas é muito importante para o processo que conduz, ou não, à psicopatologia, em particular no que se refere a perturbações do humor e ansiedade.
Ser capaz de se recuperar rapidamente é essencial.
Os experimentos que levaram à conceituação desse estilo ocorreram no início de minha carreira. Nesses estudos, constatamos que as pessoas diferem entre si, na medida em que algumas apresentam o hemisfério esquerdo mais ativo do que o direito, e essas diferenças são estáveis ​​no tempo.
Verificou-se que as pessoas com uma maior ativação do hemisfério esquerdo recuperam-se mais rapidamente quando submetidos a estímulos emocionais negativos administrados em laboratório.

Você acredita ter identificado todos os estilos emocionais, ou poderiam existir outros?

Não considero esses seis estilos emocionais como definitivos. É muito importante ressaltar que se trata de uma hipótese, baseada em pesquisas realizadas. Mas a ciência não é estática, e os nossos modelos estão sempre evoluindo. Tenho certeza de que daqui a 10 anos iremos pensar de forma diferente, pelo menos em parte.

É importante acrescentar que um estilo não é melhor do que outro. Muda de pessoa para pessoa e de acordo com o ambiente em que se vive. Algumas pessoas, por exemplo, podem ter uma “intuição social” muito pobre e podem não ser muito hábeis na decodificação de sinais não-verbais das emoções, mas ao mesmo tempo podem adequar-se perfeitamente para trabalhar com máquinas. Por exemplo, podem ser programadores bem sucedidos, que preferem não gastar muito tempo saindo com os outros. Também precisamos de pessoas assim em nossa sociedade.

Parece, no entanto, que alguns estilos podem tornar a vida mais difícil, por exemplo, se a resiliência diante da adversidade é muito baixa. Como as pessoas podem descobrir se seu estilo emocional é adequado ou não?

Boa pergunta. Acredito que, em casos extremos, a pessoa possa estar ciente disso. Por exemplo, se as pessoas não estão sendo capazes de lidar com as dificuldades da vida diária, então provavelmente sabem que seja qual for o estilo emocional adotado, este não é o ideal.

Em nosso meio há, provavelmente, muitas pessoas que não estão conscientes do seu estilo emocional.
Na verdade, um propósito importante deste livro é ajudar as pessoas se tornarem mais conscientes, porque a consciência é o primeiro passo para promover a mudança.

Os estilos emocionais, então, podem mudar. De que maneira?

Uma de minhas principais premissas é que os estilos emocionais são baseados em circuitos específicos do cérebro. E, como sabemos que o cérebro tem uma certa plasticidade, os nossos estilos podem ser alterados pelo que eu chamo de intervenções comportamentais “neuro inspiradas”. Na verdade, existem práticas desenvolvidas a milhares de anos atrás, que provam ser muito úteis para esse fim, provenientes das tradições meditativas.

Fui muito influenciado por esse tipo de saber. No livro eu falo sobre o meu primeiro encontro com o Dalai Lama, em 1992, que desempenhou um papel fundamental na minha carreira, tanto profissionalmente como pessoalmente.
Os seus métodos são muito simples e podem ser ensinados, de uma forma completamente laica, para transformar a mente e mudar o cérebro e, por conseguinte, possibilitando modificar os estilos emocionais.
Por exemplo, um método muito popular de meditação é chamada de meditação de auto-consciência. Este método ensina as pessoas a prestar atenção sem julgar.

A característica de não ser crítico é muito importante, porque nas interações emocionais - particularmente as negativas – se presta atenção julgando, e esses julgamentos levam a “ruminação” mental.
Por exemplo, se brigamos com alguém na parte da manhã, algumas pessoas tendem a reproduzir mentalmente a discussão que ocorreu durante todo o dia. E isso tem um efeito deletério sobre o nosso humor e nosso comportamento durante várias horas após o incidente.
A atenção não-crítica permite uma recuperação mais rápida em face a adversidade. Uma pesquisa recente está mostrando exatamente isso.

De que forma a prática da meditação tem influenciado o seu trabalho e seu estilo emocional?

Eu a utilizei para ser mais calmo. Não que eu fosse um tipo irascível, mas certamente às vezes eu ficava visivelmente irritado. E eu diria que a frequência desse tipo de comportamento mudou drasticamente ao longo dos últimos 10 anos especialmente. Estamos falando de um comportamento muito real.

Do ponto de vista de um observador externo, levo uma vida muito estressante. Eu viajo muito, trabalho muitas horas por dia e em uma área muito competitiva: tenho que obter bolsas de estudo, produzir muitas publicações, dirigir um laboratório, com o cumprimento de prazos muito restritos. E na maior parte do tempo faço tudo isto com suficiente tranquilidade - mesmo que não seja perfeitamente, sempre existindo muitas oportunidades de melhoria. Mas eu não acho que poderia fazer o que faço, da mesma forma que faço, sem a prática da mediação diária.
Devo ainda acrescentar que a palavra "meditação" vem da palavra sânscrita "familiarização".

E de acordo com esta definição, a meditação é na realidade familiarizar-se com a própria mente. Eu iria mais longe ao dizer que para um estudante da mente, um psicólogo, seria muito útil fazer meditação, pois é uma prática que permite a você se familiarizar mais com própria mente... E isso, creio, vai ajudá-lo a desenvolver melhor a profissão de psicólogo.


Artigo de Lea Winerman - http://www.apa.org/monitor/2012/09/brains.aspx

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